BUSCANDO COMPLEXIDADES
Os EUA ainda não haviam invadido o Iraque, rompendo com a ONU e estarrecendo o mundo, quando Douglas e eu travamos, em fevereiro, mais esta conversa, entre as muitas que mantivemos ao longo de quase uma década de amizade e parceira, embora o tema guerra esteja nela presente, ao lado de outros, como a violação de direitos civis nos EUA.
Douglas é poeta, dramaturgo e o criador da Sun & Moon Press, de Los Angeles, que editou, entre seus inúmeros títulos, Nothing the sun could not explain/ 20 Brazilian Contemporary Poets, em 1997, livro que agora se reedita, ampliado e revisado, na coleção PIP, World Poetry of the 20th Century, da Green Integer, casa que também dirige.
Há menos de duas semanas, falava-se de uma 2a Guerra do Golfo “curta”, rápida, todavia, não mais se sabe o que irá acontecer. Hoje, 29 de março, quando escrevo esta nota, por exemplo, um carro-bomba, com quatro homens dentro, foi usado, num ataque suicida, para destruir um posto de controle norte-americano, perto de Najaf, no sul do Iraque e, hoje, também, o vice-presidente do Iraque afirmou que esse tipo de atentado se transformará em rotina, tanto em teritório iraquiano quanto em território norte-americano ou britânico. Não se pode mais, portanto, prever a extensão e o impacto desta guerra, que todos, com exceção dos “bushianos”, condenam e que, inevitavelmente, influencia as discussões artísticas.
Nesta conversa, Messerli trata, entre outras, da questão do “antiamericanismo”, que, a cada dia, cresce no mundo, atingindo, inclusive, os norte-americanos que são contra a guerra e as ações de seu presidente.Régis Bonvicino
Régis Bonvicino: Como o editor, o dramaturgo e o poeta coexistem em você?
Douglas Messerli: Algumas pessoas, talvez a maioria delas, têm várias facetas – poderíamos até dizer, várias personalidades. Mas a maioria das culturas contemporâneas inibe isto, buscando, ao contrário, uma pessoa unificada em cada um de nós e desencorajando aqueles que procuram explorar sua multiplicidade interna. Temos, nos Estados Unidos, inclusive, diversos provérbios e clichês sobre o tema: “Jack of all trades” (pau para toda obra), “master of none” (perito em nada) etc.
Por alguma razão, eu nunca tive problemas em desempenhar muitos papéis e meu amor pela literatura e todos os seus gêneros também se espalha para as outras artes – cinema, dança, música, interpretação etc. Num determinado momento, eu tentei, nem sempre com sucesso, todas essas artes. Estudei dança por um tempo no Joffrey Ballet, em Nova Iorque; ganhei uma bolsa de música para estudar canto mas a recusei e, neste período, tentei ensinar cinema. Obviamente, uma pessoa não pode fazer tudo com a mesma destreza. Entretanto, minha paixão por essas áreas não diminuiu e sempre que possível tento integrá-las ou explorá-las separadamente. Para mim, publicar e escrever são partes de uma mesma atividade – tentar explorar a complexidade e partilhá-la com outros. Trabalho tanto como editor quanto como escritor, o que talvez explique minha contínua dificuldade financeira e, às vezes, minha falta de sucesso econômico. Sou um fracasso como homem de negócios, mas como artista e editor minha produção se distingue, acredito eu! Adoro teatro mais do que qualquer coisa, mais do que ler qualquer ficção e eu já li e escrevi ficção antes de descobrir a poesia.
Às vezes, no entanto, acho importante explorar diferentes gêneros ou áreas artísticas de maneiras diferentes. Não se pode escrever um drama da mesma forma que se escreve ficção; veja Henry James, por exemplo. Assim, tenho usado muitos pseudônimos em minha carreira, escrevendo peças teatrais sob o nome de Kier Peters; escrevendo filosofia e teoria (embutidas em meus espetáculos e ficção) como Claude Ricochet; projetando como Katie Messborn; escrevendo ficção sob o nome de Joshua Haigh e mais recentemente editando sob o nome de Per Bregne. Isto me permite explorar coisas em níveis diferentes. Kier não precisa escrever o tipo de poesia complexa que Douglas escreve. Douglas não consegue criar as perplexidades filosóficas e charadas criadas por Claude Ricochet; Joshua tem uma vida sexual que poderia chocar Kier e Douglas etc. Estes pseudônimos me permitem explorar diferentes aspectos de mim mesmo – de diferentes aspectos de possíveis identidades. De certo modo, é parecido com o que um ator faz, mas, ao invés de fazê-lo com o corpo, eu faço sobre a página ou a página ou texto se torna meu corpo. E meu papel de editor é parecido com o de um produtor ou diretor, permitindo que outros corpos, outros “eus” ganhem vida. Fazer todas essas coisas pode confundir as pessoas um pouco. Infelizmente, os escritores mais famosos normalmente só fazem uma coisa, repetidamente, e são definidos por aquela coisa maravilhosa que fazem. Eu simplesmente não funciono assim.
RB: O que você está escrevendo no momento?
DM: Acabei de terminar um grande projeto que, de certa forma, é a continuação de muitos dos meus projetos de escritor. Escrevendo através de livros de vários amigos poetas, eu lhes enviei um poema em prosa – escrito quase como se fosse uma carta incluindo suas próprias frases, palavras ou padrões de palavras, entonações – e lhes pedi para responder – ou escrevendo através de meu trabalho, ou através de textos que acabara de lhes enviar ou por outro meio que preferissem. As respostas foram bastante variadas e muitas foram realmente brilhantes. O resultado, um livro intitulado Between, poderia representar um tipo de comunhão entre escritores, um tipo de escrita comunal, e, se por sorte for publicado, um recurso da/para a comunidade em geral. É isto que tenho feito até hoje, uma colagem da vida e textos literários, tentando fazer perguntas diferentes de formas bem variadas.
No momento, estou trabalhando num livro que se chamará Performances, que representa tarefas da escrita (tópico, método, estilo, etc.), que me foram dadas por outros poetas e escritores, e que, por sua vez, serão entremeadas por poesia, que pode ser interpretada, quase como Prounouns (Pronomes) de Jackson Mac Low, que eram danças.
Além disso, acabei de escrever uma pequena peça, uma espécie de resposta a Mrs. Reynolds de Gertrude Stein, que, como o seu trabalho, mas diferentemente dele, fala sobre guerra e violência. Chama-se A Man Shooting or Threatening to Shoot a Gun (Um homem atirando ou ameaçando atirar com uma arma) e aparecerá num livro que estou editando intitulado Several Reasons Not to Go to War (Várias razões para não ir à guerra). Logo depois do natal (2002), enviei cerca de 1.000 cartas para pessoas nas artes, política, negócios, educação e outros setores para que respondessem em poucas palavras porque nós (qualquer sociedade) não deveríamos ir à guerra. Pensei que receberia um grande número de respostas, mas até agora só recebi 20, embora de figuras muito importantes: Doris Lessing, Alex Katz (um artista visual), Juan Goytisolo, Eric Overmyer (um dramaturgo), Barbara Boxer (uma senadora da Califórnia), John Baldessari (um artista visual), John Arden (um dramaturgo britânico), Mark Burgin (um respeitável matemático) e outros. Espero conseguir pelo menos entre 50 e 100 respostas. Mas parece que terei que enviar mais cartas. Infelizmente, isso revela algo de uma sociedade que tem dificuldade em responder uma simples pergunta – ao menos a meu ver. Acho importante deixar algum tipo de testamento para nossa própria geração e para outras sobre o que pensávamos sobre a guerra – qualquer guerra, não somente a iminente guerra no Iraque.
Você, Régis Bonvicino, poderia escrever algo sobre isso?
RB: Qual a sua posição com relação ao presente cenário da poesia americana e internacional? Há poetas fazendo um trabalho importante e inovador?
DM: Há muitos anos acredito que a poesia (principalmente nos EUA) está indo muito bem, em parte, porque todas as considerações financeiras desapareceram da equação. Conseqüentemente, diferente da ficção e do drama, não há razão para se escrever de uma determinada maneira ou forma. Escrever de forma mais popular não atrai mais atenção ou maior público (a não ser ocasionalmente) do que escrever usando formas ou métodos mais inovadores. Entretanto, me preocupa um pouco o fato de que as novas gerações – digamos mais jovens do que os poetas da minha idade e alguns anos mais jovens – não se desafiam. Muitos jovens autores interessantes simplesmente não produziram nada além de um ou dois volumes. Isso se deve, em parte, ao fato de haver poucas editoras com jovens editores; parece que a maioria dos jovens editores e suas editoras são bem pequenos e publicam somente dois ou três livros no máximo. Isto significa que se tornará cada vez mais difícil para poetas jovens encontrar métodos de distribuição e publicação. É necessário que haja um senso mais comunitário de urgência, de poetas se reunindo para imprimir e disseminar seus trabalhos, mas a meu ver (e talvez seja o ponto de vista de um homem velho) parece que falta o intercâmbio e a excitação da escrita jovem. Basicamente, isso significa que a poesia inovadora pode diminuir num futuro próximo. Quero dizer que hoje não parece haver o senso de excitação que havia quando os poetas da “l=a=n=g=u=a=g=e” e outros estavam descobrindo suas vozes; tenho inclusive ouvido os jovens autores expressarem este sentimento. Mas hesito em dizer isso, pois as velhas gerações sempre parecem achar que as novas gerações estão deixando de fazer algo que elas, velhas, consideravam válido.
Há, no entanto, jovens vozes emocionantes em toda cultura e ainda há poetas maravilhosos no pico de suas carreiras em quase todos os países. Obviamente, alguns dos mais brilhantes poetas podem precisar de tempo para mostrar seu trabalho ao mundo e sempre há uns poucos que nunca são descobertos pela grande comunidade internacional ou que são descobertos décadas mais tarde. Infelizmente isto é inevitável. Mas isto torna ainda mais importante, me parece, que haja jovens editores que façam as descobertas. Se tivermos somente editores comerciais, que só podem contar com incursões ocasionais para publicar trabalhos mais inovadores, perderemos gerações inteiras e essas gerações serão debilitadas. Pode parecer que não vale mais a pena escrever poesia. E isso é o que sempre temi.
RB: Qual a sua avaliação do movimento “l=a=n=g=u=a=g=e”? Ainda está ativo?
DM: Não. Acho que Ron Silliman e eu concordaríamos que a “l=a=n=g=u=a=g=e” era uma comunidade, não um tipo de escrita, e essa comunidade deixou de existir. Muitas dessas comunidades existiram ao longo do tempo – Imagistas, Vorticistas, Objetivistas, os Beats, a escola de Nova Iorque, mas, de uma forma ou de outra, morreram. Foram úteis somente em promover a poesia de seus “membros”. Certamente há questões sendo trabalhadas por trás desses agrupamentos, mas elas são normalmente vagas e freqüentemente contraditórias se realmente enfocarmos a poesia em si. No final, esses agrupamentos se tornam apenas assuntos históricos, com pouca relevância para a poesia que foi produzida. Acho que visto dessa forma, pode ser útil para escritores mais jovens encontrar essas comunidades e tentar definir seu trabalho num contexto específico que o faça parecer diferente da escrita do passado ou outra escrita homogeneizada. Mas, como Charles Bernstein bem expressou, tais agrupamentos podem ser perigosos, excluindo ao invés de incluir, destruindo algo ao invés de construir. Temos sempre que abordar esses agrupamentos com bom senso de humor e incerteza.
RB: Você é um dos editores de poesia mais importantes do mundo; você publica poetas de quase todos os continentes. Conte-nos algo sobre essa experiência, que é rara para os EUA, um país fechado para poesia estrangeira (ou poesia traduzida).
DM: Eu realmente me sinto solitário, muitas vezes. Com certeza há editores (e poetas) que tentaram tornar disponível o trabalho de escritores internacionais. Nos vêm à mente os admiráveis exemplos de Rosmarie e Keith Waldrop, Jerome Rothenberg, Pierre Joris, Anselm Hollo, Charles Bernstein, de figuras mais jovens como Andrew Maxwell e Guy Bennett. Mas você está certo em dizer que, de modo geral, o mercado dos Estados Unidos não é apropriado para a poesia mundial. Pode-se dizer que é verdadeiramente hostil.
Mas antes de falar sobre isso e sobre as minhas atividades editoriais, acho justo acrescentar que, embora grande parte do mundo leia obras americanas e britânicas muito mais do que os leitores americanos ou britânicos lêem de autores de outros países, muitos dos mercados de hoje (se podemos usar tal palavra no contexto da poesia) não estão inteiramente abertos às obras de outras culturas. Veja os franceses, por exemplo, como aqueles que aparentemente só são capazes de publicar poetas americanos que ou falam francês ou têm fortes ligações com poetas que falam francês. Dá a impressão de que é um pequeno clube; se você conhece alguém, você tem chances de ser traduzido, ou convidado etc. Eu francamente acredito que, entre os poucos que trabalham com poesia internacional nos Estados Unidos, há um processo acentuadamente avaliatório: importa só a qualidade da poesia e não as amizades, para determinar quem será representado.
O que tento fazer é manter-me a par de uma vasta variedade de obras (o que é naturalmente limitado pelas traduções disponíveis, mas também tento ler periódicos e encontrar tantos poetas de outros países quanto possível) e então seleciono poetas para publicar, cuja obra me comove ou me desafia ou que pareçam desafiadores para sua própria cultura. Para mim, esta é uma atividade realmente excitante, é como descobrir mundos inteiramente novos todos os dias. Há sempre o risco do exotismo, obviamente, isto é, do diferente ser de alguma forma melhor ou mais interessante. Mas tento compreender a obra, até onde eu sei e posso, dentro do contexto da cultura em que foi escrita. E até mesmo algum lapso em tornar a obra exótica é melhor do que focar somente no que se sabe na sua própria situação cultural.
Sinto-me grato por poder fazer parte do mundo de poesia internacional. Certamente, expandiu minha própria obra e me fez entender conceitos e métodos que eu poderia nunca ter visto se tivesse mantido foco no cenário americano.
Finalmente, para mim sempre foi natural estar interessado em toda literatura. Sinto-me da mesma forma com relação à ficção e ao drama – cinema, dança e artes; gosto de saber o que está acontecendo em todos os lugares. Suponho que foi isso que aconteceu, em parte, ao atingir a maioridade na década de1960, quando Grove Press e a revista Evergreen e as antologias da poesia mundial da Penguin se tornaram uma leitura tão estimulante. Primeiramente, li Ionesco, Genet, Beckett e, porque morei um ano na Noruega, Hamsun e Ibsen quando era um jovem adolescente. Somente mais tarde eu li autores americanos e conseqüentemente achei alguns deles (os autores americanos), que todos tanto amavam, um tanto entediantes. Por que ler Sherwood Anderson e até mesmo Hemingway quando se tem acesso a um universo de escrita tão rico? E agora estou tentando tornar aquele mundo rico acessível para os outros. É uma tarefa que só abandonarei quando cair morto.
RB: Qual sua opinião sobre o governo Bush?
DM: Eu não votei no cowboy. Eu realmente sou contra tudo o que ele e sua administração têm feito.
RB: Você acha que o governo Bush contribui para aumentar o preconceito, fora dos Estados Unidos, contra os poetas americanos?
DM: Bem, ele certamente não passa uma boa imagem dos americanos. Entretanto, acho que a maioria sabe que, nos Estados Unidos, há muitas pessoas – particularmente nas artes -, que não concordam com os líderes do país. Creio que, como em toda situação, temos que julgar as pessoas como pessoas, não como parte de seu país. Presumo que, durante a ditadura no Brasil, os poetas não eram maltratados em outros países simplesmente por causa da ditadura. Em outras palavras, acho que a maioria reconhece que, na verdade, os poetas geralmente (nem sempre é claro) se posicionam contra os valores expressos de seu país. Contudo, no caso da guerra contra o Iraque, eu diria que os valores são os do presidente e não os do país, inteiro. Mas quando saio de meu “mundo”, sempre me decepciono com o que os americanos realmente pensam. Então posso estar errado, a guerra pode ser um valor do povo norte-americano, do qual não compartilho.
RB: Qual a situação dos direitos civis nos Estados Unidos hoje?
DM: Para os cidadãos americanos parece não ter havido grandes mudanças – embora eu acredite que veremos as implicações das ações de Bush, Cheney e Rumsfeld no futuro. Para os não-cidadãos, mesmo aqueles que estão no país há algum tempo, os direitos se deterioraram bastante. Acho que muitos de nós ainda não sabemos direito o que aconteceu, que inúmeros foram presos e estão detidos simplesmente por serem de outros países. Em parte, parece haver muitos que estão secretamente detidos, isto é, a imprensa não tem acesso a eles (e às vezes parece não ter interesse neles). Pessoas são detidas e as informações sobre tais prisões são fragmentadas, na melhor das hipóteses. Sei por exemplo que meu locador lutou contra a prisão de um de seus mais antigos inquilinos e finalmente conseguiu sua liberdade. O indivíduo foi evidentemente preso simplesmente porque, apesar de viver muitos anos nos Estados Unidos, ainda era um cidadão iraniano. O processo levou meses e o homem ficou detido -quase secretamente – durante todo o tempo. Se isto está acontecendo em vários casos (e devemos presumir que está acontecendo com certa freqüência), então podemos esperar terríveis restrições para todos no futuro. E é claro que isto é detestável.
No momento, as restrições estão lá, escondidas sob o nome de “proteção contra o terrorismo”. Todos sentimos que deve haver buscas mais rigorosas nos aeroportos etc. Mas poucos falam dos recentes problemas como o de fazer transações bancárias corriqueiras, por exemplo, que estão sob censura. Qualquer cheque de outro país passa por análises cuidadosas e só é compensado depois de semanas. Houve mais prisões simplesmente por envio de mensagens eletrônicas. E, tenho certeza, que alguns métodos utilizados para “nos proteger” levarão a maiores restrições ao nosso cotidiano, no futuro. Temo que a maioria aceite cegamente estas restrições em nome da “luta contra o terrorismo”. Às vezes, parecem abraçar essas restrições.
RB: Como um editor mundial, quem você considera o melhor poeta vivo do mundo hoje?
DM: Ah, seria muito difícil responder de forma direta. Para cada nome que eu citasse haveria 50 poetas magoados por não terem sido mencionados. Deixe-me colocar desta forma: se eu estivesse no comitê do prêmio Nobel eu certamente olharia cuidadosamente para a poesia do que poderíamos educadamente chamar de “gerações de sucesso”. Os poetas abaixo dos 60 são de pouco interesse para o grupo do prêmio Nobel, mas incluí alguns. Aime Cesaire (Martinica) (ainda vivo), Adonis (Síria), Inger Christensen (Dinamarca), Jacques Roubaud (França), Visar Zhiti (Albânia), Mohammed Dib (Argélia), Henrik Nordbrandt (Dinamarca), Robert Creeley (EUA), Yang Lian (China), Yoshimasu Gozo (Japão), Takahasi Mutsuo (Japão), Friederike Mayrocker (Áustria), Barbara Guest (EUA), Andrea Zanzotto (Itália), Ilse Aichinger (Áustria), Elisabeth Borchers (Alemanha), Gunter Kunert (Alemanha), Tomas Salamun (Eslovênia), Adam Zagajewski (Polônia), Tomas Transtromer (Suécia), Rutger Kopland (Holanda), Haroldo de Campos (Brasil) e Paavo Haavikko (Finlândia)
RB: A questão da inovação ainda é válida para você hoje em dia?
DM: Sim, ainda conta. Acredito que a poesia deveria ser uma notícia atual, que ainda é notícia. Creio que repensar as coisas, pesquisá-las novamente, tentando encontrar meios novos e diferentes para descobrir coisas, é importante. Acho que jamais me interessei por poesia que fosse inovadora só pela inovação. Detesto a idéia do “experimental” porque soa como se estivéssemos constantemente brincando com as coisas ao invés de realmente dar atenção a elas. Entretanto, a brincadeira também tem seu papel na descoberta, não é? E estou disposto a brincar com palavras algumas vezes. Acredito firmemente que o novo sentido de “romantismo” (se você o chama assim) que tem estado presente na minha obra nos últimos anos ainda é – dado meu contexto lingüístico – inovador.
Acho que o problema é que todos os poetas se acham inovadores. Mas isso é outro assunto, normalmente resultado do fato de que muitos não lêem o suficiente. Se eles realmente lessem poesia mundial como eu tenho feito nos últimos anos, acho que a questão da inovação se tornaria talvez mais importante, pois veríamos como é difícil fazer algo verdadeiramente “original” ou novo. Contudo, isso pode levar muitos dos poetas do meio-termo – poetas por quem tenho pouco interesse, se é que tenho algum – mais além na esfera do novo modo de pensar. Não seria maravilhoso?
RB: Até que ponto você acha que os poetas americanos/ poesia americana de hoje se comunica(m) com poetas/ poesia de outros países?
DM: Bem, obviamente não o suficiente. Há poucas exceções: Rosmarie e Keith Waldrop, Jerry Rothenberg, Michael Palmer, Charles Bernstein, Paul Vangelisti, Guy Bennett e outros que regularmente se engajam em um intercâmbio com a poesia de outros países, como você, Régis, bem sabe. Mas são poucos. Estranho que o “tribalismo” ou “localismo” cresça numa época em que a comunicação internacional é tão fluída e flexível, em que mais e mais países estão sendo criados. E a poesia – a maioria das poesias, na verdade – parece tão isolada. Nos anos 1960 todos líamos Beckett, Genet, Pinter, Ionesco, todos os romancista sul-americanos e poetas mundiais publicados pela Penguin, Grove Press, Evergreen etc. Agora parece que muitos de nós não poderiam nem citar 20 poetas internacionais. Fiquei surpreso ao descobrir recentemente que um querido amigo, um amigo poeta versado e curioso, nunca tinha ouvido falar do poeta cuja coletânea eu tinha em mãos: Leopold Sedar Senghor, o grande poeta e político senegalês. Mas obviamente esse isolamento poético está intimamente relacionado à desconfiança e desentendimento tão aparentes hoje em eventos mundiais. Se você tem um presidente que mal pôs os pés em outro país antes de ser eleito, então fica difícil para ele (e para o país) entender as ações de qualquer um fora do contexto americano. O que aconteceu com a comunidade internacional? Meu Deus, a América está, até, numa guerra verbal com a França! Hoje na Internet vi alguém defendendo o boicote a produtos franceses! Talvez os americanos tenham começado a pensar que todos deveriam compartilhar não só de suas lojas Mc’Donalds e Gap, mas também de seus valores. Que mundo entediante ele seria!
O que nos remete, claro, ao meu interesse em publicação internacional. Farei o que eu puder para confundir a pobre mente americana. Como escrevo na capa posterior de meus livros, o objetivo do Green Integer, minha editora, é “fazer a sociedade experimentar pelo menos um leve tremor de confusão e medo”.