Estado Crítico

Desde Página Órfã, radicalizada neste Estado Crítico, não vejo poesia que faça crítica mais implacável da poesia e, ao mesmo tempo, melhor se reafirme como poesia, do que a de Régis Bonvicino. E é assim não porque esses livros falem de poesia ou teorizem sobre a crise da poesia, mas porque se movem taticamente em torno de seus impasses, implantando-se num terreno no qual os versos ocupam as vias mais hostis da metrópole.
A partir dessas condições de implantação, a poesia de Régis opera três movimentos.
O primeiro é o de anotação crua dos eventos, de enumeração da atividade caótica das coisas tais como se oferecem ao voyeur, que mantém o olhar firme e interessado – mas nunca partidário – diante das cenas oferecidas a sua vista, sejam elas banais ou escabrosas. Se Alexandre Astruc falava, em 1948, da caméra-stylo, por meio da qual o cinema se encontrou como linguagem, a poesia de Régis, por assim dizer, emula o cinema neorrealista e produz um stylo-caméra, que dispensa a linguagem não submetida ao regime das coisas experimentadas pela vista.
Alcir Pécora